
BENTO CEGO
O Primeiro Trovador do Paraná
Bento (Cordeiro) Cego é uma das personalidades de maior importância para a nossa cultura poética, com referências do início do século XIX. Nascido em Antonina, no bairro do Registro no ano de 1821, cego de nascimento, cantador e violeiro, andava pelas ruas de nossa cidade “dedilhando a viola e desferindo o canto”, como nos conta Ermelino de Leão em seus escritos *. Os poemas de Bento estavam bem mais para repentes - versos improvisados – expressão apropriada e divulgada em sua época, principalmente quando se tinha um bom desafiador. Bento ganhava todas as disputas e sua fama ultrapassava os limites da Província. Em um determinado dia – conta à história – nas planícies dos Campos Gerais houve uma grande disputa com o famoso “senhor das trovas” Miguel Arriola, que lançou seu primeiro verso desafiador: “Meu ilustre Bento Cego, Homem muito sabichão, Eu quero que “mecê” me diga, Quantos pelos tem um cão? Apesar da difícil pergunta, Bento imediatamente respondeu: “Ilustre Miguel Arriola, Homem de sabedoria, Mecê pergunte pras pulgas, Que melhor responderia”. Arriola se deu por vencido e a partir daí Bento passou a ser aclamado em vários Estados vizinhos.
Não se tem dados quanto a data da morte de Bento Cego, mas consta que faleceu no Estado de São Paulo, palco do seu sucesso. O que se sabe é que ele morreu cantando, conforme a máxima da sua poética:
Eu hei de morrer cantando
Cantando me hei de enterrar,
Cantando irei para o céu,
Cantando conta hei de dar.
Ermelino de Leão termina o seu texto com a seguinte citação de Nestor de Castro: “Nós com a fraqueza da nossa inteligência, apenas levantamos agora esta pequena homenagem ao teu nome glorioso, em torno do qual já vão desabrochando os clarões munificentes da história”.
Pouco mais se sabe sobre a vida do grande poeta antoninense. No ano passado foi rodado um curta metragem inspirado em sua pequena história, com cenas rodadas em Antonina e periferia, que contou com a direção do cineasta Geraldo Pioli, e com a participação do músico e compositor antoninense Alecir Carrigo, interpretando Bento Cego.
Referência Bibliográfica: LEÃO, Ermelino. “Antonina, Fatos e Homens”, pub. 1926. Original.

TROVAS DE BENTO CEGO
atualizadas ortograficamente por Ivan Justen Santana.
(Fonte: CASTRO, Nestor de. Bento Cego. Curitiba: Impressora Paranaense / Correia & C., 1902.)
Vou-me embora! Vou-me embora!
Correr o mundo de Deus.
Minha mãe, fique tranquila,
Sem pesar dos olhos meus.
Ninguém chore a desventura
De quem vivendo sofreu;
Eu padeço nesta noite
Que o meu olhar envolveu.
Mas hei de voltar cantando
Pra sentir vossa afeição.
Eu parto, senhora, eu parto
Deixando meu coração.
Eu hei de morrer cantando,
Cantando me hei de enterrar,
Cantando irei para o céu,
Cantando conta hei de dar.
__
Ai, luar, eu não te vejo
Doirando minha existência.
Quero crer que Deus não tenha
Por mim sincera clemência.
Todos amam neste mundo,
Todos vivem de gozar;
Eu só sinto que me findo
Em meu terrível penar.
Hei de ir assim vivendo,
Sofrendo na noite escura;
'Té que venha o claro dia
Do gozo na sepultura.
__
Vou-me, vou-me para o alto
Como a pomba do sertão;
Queira Deus que eu volte logo
Com prazer no coração.
Bem-te-vi da folha seca,
Quero-quero, Jaçanã
Contai ao Deus das alturas
Que me fui esta manhã.
Que me fui, mas sem ventura
Pra cumprir tão dura sina.
Queira Deus que eu volte logo
Meu amor, minha Antonina.
Senhora Virgem, Senhora
Da Capela do Pilar,
Socorrei-me na desgraça,
Se na desgraça me achar.
Vou-me, vou-me para o alto
Como a pomba do sertão;
Queira Deus que eu volte logo
Com prazer no coração.
__
Se Deus baixasse do céu
Para ver a criatura,
Horror teria do mundo,
Deste vale de amargura.
Aqui não há quem não viva
Em luta triste de morte;
Ninguém pensa, ninguém fala
A não ser na própria sorte.
A não ser na própria sorte
Sem consolo dar aos mais;
Cada qual quer ser um rei
Pra mandar nos próprios pais.
Não há dor que nos convença
Do sofrer que os outros têm;
Cada qual consigo vive,
Pensando que assim vai bem.
O traidor principalmente
Tem na fala tentação,
E sorri quando nos crava
Seu punhal no coração.
Andando vivemos todos,
Sem um momento parar,
Uns chorando, outros sorrindo,
No sofrer ou no pesar.
Se Deus baixasse do céu
Para ver a criatura,
Horror teria do mundo,
Deste vale de amargura.
BENTO CEGO
Roteiro e Direção
Geraldo Pioli
PJ Friebe